A Incrível Orquestra da
Floresta
No princípio,
antes do homem habitar a terra, só haviam os animais. Eles também já eram
organizados. Tinham seus reinos e suas leis.
No princípio, não existiam países e nem
fronteiras, somente os rios, as montanhas e os oceanos separavam a terra.
A terra não se chamava terra, chamava-se
Grande Vale, e à cada lugar dava-se um nome que se adequava aos animais que lá
viviam.
O Vale da Alegria era governado pelo Rei
Alfeu, o mais inteligente dos elefantes. O Rei era casado com a Rainha Débora, uma
elefanta linda e amorosa.
O Vale da Alegria estava se preparando para
uma grande festa, Depois de vinte e dois meses, estava chegando a hora de se
conhecer o Príncipe herdeiro, a Rainha Débora iria dar à luz.
Os moradores do Vale da Alegria esperavam
ansiosos pelo anúncio do nascimento do bebê real. Mas mesmo com toda alegria, também
havia a preocupação com a reunião do Grande Conselho dos Mais Velhos.
Segundo a lei do Vale da Alegria, todo bebê que
nascia e logo que conseguisse ficar de pé, deveria ser imediatamente
apresentado ao Grande Conselho, pois os que nasciam com alguma imperfeição, seriam
enviados para o exílio no Vale da Tristeza.
O vale da Tristeza era um lugar terrível, feio,
era somente o lugar em que os pobres animaizinhos eram deixados sozinhos para
morrer.
- O Príncipe nasceu!
Anunciou
o Mestre Gorila Orador.
Gritos e vivas ecoaram durante toda a noite
no Vale da Alegria.
Depois da grande noite de festa, era chagada
a hora mais tensa, o momento de apresentar o bebê real ao Grande Conselho.
Reunido o Grande Conselho, a Rainha Débora
apresentou seu bebê:
-Senhores! Apresento-lhes meu filho, o Príncipe
herdeiro do trono do Vale da Alegria.
Ao ver o Príncipe caminhando, a Hiena
Carlos, um dos inimigos do Rei Alfeu, em tom alarmante e com indisfarçável
satisfação, gritou:
- O Príncipe é manco! Está condenado ao
exílio no Vale da Tristeza!
A rainha pôs-se a chorar e seu choro comoveu
a todos, que também não resistiram e choraram com ela, exceto, a Hiena Carlos.
Foi
estabelecida a data da partida para o exílio, seria em três meses.
Durante
muitos dias, a tristeza era imensa, a Rainha continuava seu choro dolorido e
infinito.
O Rei estava
quieto, pensativo e envolto em profunda tristeza.
Após
conversar durante dias com a Rainha, o Rei convocou todos os moradores do vale
para uma reunião e anunciar uma decisão que haviam tomado:
-Senhores do
Grande Conselho e todos do Vale da Alegria, como não podemos deixar de cumprir
a lei antiga, eu e a Rainha, abdicaremos do trono e partiremos com nosso filho
para o Vale da Tristeza!
Imediatamente, logo após a renúncia do Rei,
a Hiena Carlos assumiu o trono, mesmo sob muita briga e discórdia.
O Rei,
a Rainha e o Príncipe, preparavam-se para partirem sozinhos para o exílio, mas
foram surpreendidos pelo Macaco Gabriel:
- Meu rei! Vossa Majestade e sua família não
irão sozinhos, montamos um grupo e partiremos com vocês!
Tigres, rinocerontes, girafas, pássaros
entre tantos outros animais acompanharam a família real para o Vale da
Tristeza.
Foi um longo caminho, uma jornada difícil, dias
e mais dias com frio, fome, sede e cansaço.
Depois de dois meses, enfim, entraram no tão
temido Vale da Tristeza. Tudo era desolador, animais doentes, muito choro e
amargura. Animaizinhos tristes, indefesos, inocentes e abandonados eram os
únicos habitantes daquele lugar tão feio.
O Rei Alfeu, usando toda sabedoria e amor, logo
declarou:
- Aqui, somos e sempre seremos todos iguais,
somos todos irmãos! Vamos no proteger e cuidarmos uns dos outros! Vamos viver
em paz e igualdade até o fim de nossos dias!
E assim foi feito.
Nos primeiros dias, somente os animais saudáveis
caminhavam longas horas em busca de água e comida, o que não era fácil
encontrar. No começo era pouca água e comida, mas foram descobrindo novos
lugares.
O Macaco Gabriel era engenheiro, logo
começou a construir coisas para ajudar os deficientes, com pedaços de árvores
fez uma prótese para alongar a perna do Príncipe, que nunca mais teve que andar
mancando. O Macaco Gabriel fez coisas incríveis, reconstruiu com galhos e
folhas asas para os pássaros e fez muito mais maravilhas.
Pouco tempo depois, todos os animais já
podiam sair em busca de água e comida. O caminho era longo, mas cada um, à sua
maneira conseguia trazer um pouco.
Um dia, O Príncipe, observou que grande parte
da água que traziam ia ficando pelo caminho e falou com sua mãe:
- Mamãe, a
água está caindo no chão.
A Rainha sorriu, pediu para que todos
prestassem atenção e explicou:
-A água que vai ficando pelo caminho, vai
deixar nossa caminhada mais suave, a terra ficará mais fresca.
A Girafa Eurides perguntou:
-Rainha, então a senhora tem o trabalho de
trazer tanta água para depois ir deixando cair no chão, de propósito?
Novamente sorrindo a Rainha voltou a
responder com ternura:
-Sim, é preciso. Este lugar é quente, feio, triste,
sombrio e escuro. Essa água que deixamos cair, vai fazer brotar plantas, vai
trazer os insetos, vai fazer nascer as flores, as flores nos trarão as
borboletas e as borboletas nos trarão a primavera.
A primeira borboleta, enfim, bateu suas asas
no Vale da Tristeza.
Depois de muito, muito tempo, o Vale da
tristeza foi ficando cada dia com mais claridade, as nuvens escuras
dissipavam-se, brotaram plantas, flores, surgiram as nascentes com água pura. Todos
sentiam-se felizes.
A Girafa Eurides sugeriu:
- Vamos mudar o nome deste Vale, o que
acham?
Todos concordaram alegres.
-De hoje em diante vamos chamar de Vale da
Felicidade.
Houve muita festa e alegria.
O Príncipe, além de ter nascido com uma pata
menor, também tinha outra coisa que chamava a atenção, sua tromba era marcada
por pontos azuis verticais.
O tempo realmente passava devagar no Vale da
Felicidade, os mais novos, todas as tardes iam se reunir em uma grande pedra, ninguém
no vale sabia exatamente o que eles faziam ou conversavam, até que um dia...
Como de costume, os adultos estavam
reunidos, preparando a refeição e fazendo planos para o dia seguinte, mas um
som mágico, como se estivesse vindo do céu lhes chamou a atenção. Todos ficaram
em silêncio, de olhos fechados e emocionados. Era um som tão maravilhoso e
lindo que esqueceram do tempo. Quando deram por si, a música havia parado,
curiosos, correram em direção a grande pedra, o Príncipe e os outros
animaizinhos formavam uma linda orquestra, com harpas feitas de cipós, flautas
de bambu, tambores de casca de frutas e xilofones de pedras de quartzo. As
manchas azuis na tromba do príncipe faziam soar notas musicais, melodias
mágicas, como o som de um oboé encantado.
Era a incrível orquestra da floresta.
Tudo corria bem até que um dia chegou o
Pardal Mensageiro, ele vinha do Vale da Alegria, trazia a mensagem do Grande
Conselho, pedindo para que o Rei retornasse urgentemente. O Vale da Alegria
estava em convulsão, brigas, miséria e a ganância da Hiena Carlos, destruíram o
Vale da Alegria.
O Vale da Alegria já não era mais alegre.
Por um instante, todos os animais ficaram
preocupados, se o Rei partisse, todos voltariam a sofrer.
Mas o Rei Alfeu era muito, muito sábio e
respondeu ao mensageiro:
- Diga ao Grande Conselho que já não sou
mais rei do Vale da Alegria. Diga que aqui, todos somos iguais. Diga também, que
aqui, todos somos reis, rainhas príncipes e princesas. Aproveite e diga ao
Grande Conselho que agora, o Vale da Tristeza não existe mais. Diga ao Grande
Conselho que aqui é o Vale da Felicidade.
A primavera chegou novamente e a orquestra
da floresta se preparou para o grande espetáculo, o grande espetáculo da vida.
FIM.