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Contos Eróticos Infantis
A Prostituta da Cidade
das Andorinhas
Havia quatro meses que estávamos na estrada,
e em cada lugar,cada comunidade que chegávamos,colocávamos em prática o que os
padres nos ensinavam durante a jornada. Àquela altura, nossas mochilas já estavam
mais leves,em cada lugar que parávamos,deixávamos um pedaço da biblioteca que
carregávamos nas costas.
Havíamos estado em muitos lugares. Agora
estávamos em Anagé, uma pequena cidade no sertão baiano. Chegamos em uma tarde
de calor intenso,sob aquele céu azul-claro do mês de maio de 1984.
O céu da cidade era enfeitado por um bando
de andorinhas.
Nunca ficávamos muito tempo em cada lugar. E ali, ali não seria diferente.
Fomos alojados no quartel do Tiro de Guerra.
Estávamos eufóricos, afinal, depois de meses, iríamos finalmente dormir em uma
cama com colchão.
Dias depois de acomodados na cidade, já havíamos
nos habituado com a comunidade rural e com a rotina do lugar. E como de costume,
os padres nos informaram que era hora de partir novamente.
Os recrutas tornaram-se nossos companheiros
e amigos. Também eram nossos guias por ali e nos levavam à quase todos os
lugares onde podíamos nos divertir.
Ficou combinado que partiríamos na segunda-feira. No sábado, combinamos de ir conhecer um prostíbulo que ficava na zona rural. A
ansiedade era imensa, os hormônios de todos escapavam até pelos olhos.
Enfim, chegara o momento.Enquanto os padres
dormiam,escapamos pelas janelas laterais do velho prédio do quartel. Rapidamente
ganhamos a rua e adentramos na mata. Depois de uma longa caminhada, avistamos a
casa que ficava na beira de um riacho seco.
O lugar tinha um aspecto de pobreza extrema.
Era uma casa grande e velha, com quartos nos corredores e no quintal. A sala
era ampla e havia um balcão improvisado, feito de adobão e uma geladeira Frigidaire
caindo aos pedaços. A música saía de uma velha vitrola National, que não se
cansava de tocar um disco do Wando. Não eram muitas as mulheres, contamos oito
no total. Algumas eram até bonitas, outras nem tanto.
Os rapazes, incentivados pelos recrutas, logo
entraram na farra. Eu e Miguel Marinho ficamos sentados em um dos poucos bancos
que havia na sala, bebíamos cerveja e fumávamos nosso cigarro. Foi quando ela
entrou.
Era como se ela tivesse saído de um daqueles
filmes surrealistas. Ela era uma mulher de meia – idade, esquálida, tinha os
cabelos desgrenhados, usava um batom carmim que lhe acentuava os lábios
avantajados. Vestia uma combinação já muito gasta, com furos no sutiã. A calcinha,
além de ser maior do que seu número estava costurada nas nádegas e mal escondia
sua intimidade.Era grotesco. Mesmo com tudo isso, Zita era engraçada. Tinha bom
astral e acabou nos revelando toda a tristeza e amargura por estar ali.
Com
tantas moças jovens e bonitas no prostíbulo, homem nenhum se interessava em ir
para a cama com ela. Mesmo assim ficava por ali, limpava a casa, lavava as
roupas e servia no bar. Tornou-se uma espécie de “clown”, divertindo os
frequentadores.
Miguel Marinho e eu ficamos curiosos com
aquela figura. Zita era um personagem que insistia em querer ser real.
Zita era realmente uma mulher triste, que
fingia ser alegre para não morrer de fome naquele sertão.
Zita também nos contou que havia saído do Crato,
deixando para trás três filhos, só para tentar encontrar o marido que foi “buscar”
ouro em Serra Pelada, e que sabia que ele jamais retornaria. Zita nos contou
que depois de cinco anos, perdeu definitivamente as esperanças e começou a
perambular pelo Norte e Nordeste, até chegar até ali.
Zita sonhava em voltar para sua casa, no Ceará,
queria ficar junto dos filhos que há tanto tempo não via. Talvez, se
pudesse,montaria um pequeno negócio ou mesmo um cabaré, quem sabe?
Zita
era atormentada pelo remorso e pela saudade.
Bebemos muita cerveja, os rapazes estavam
felizes e satisfeitos. O dia começava a clarear, Zita dormia sentada em uma
velha cadeira, a vitrola havia se calado. Fomos embora.
No caminho, voltando para o quartel, falamos
de Zita, de sua história, de sua dor e de sua saudade. Fomos abatidos por um
profundo sentimento de pena e solidariedade. Nós iríamos ajudá-la de alguma forma.
Nossos corações doíam. Os corações dos recrutas e os dos civis.
Os padres nos esperavam na porta do Tiro de Guerra,
levamos muitas broncas e os sermões foram quase intermináveis.
Mais tarde, voltamos ao prostíbulo, fomos
procurar Zita. Nós lhe entregamos um pacote com todo o dinheiro que levávamos conosco,
dinheiro que nossas famílias nos enviavam e nunca tínhamos onde gastar. E não
era pouco dinheiro.
Na segunda – feira, estávamos prontos para seguir
nosso rumo. Na frente da agência de passagens estava Zita, com suas malas
surradas e com um sorriso enorme que lhe enfeitava o rosto marcado por anos de
busca e incertezas. Antes de entrar no ônibus que a levaria de volta pra casa, Zita
beijou e abraçou cada um de nós. Abraços tão cheios de gratidão que podíamos
sentir o amor exalar do coração daquela pobre mulher.
Em nossas viagens, aprendemos com os padres,
que o dinheiro não traz felicidade, mas pode comprar um pouco de paz.
Quando o ônibus que levava Zita começou a
entrar na rodovia pudemos ver o bando de andorinhas lhe seguindo.
De alguma forma, aquelas andorinhas chegaram
ali ao mesmo tempo em Zita também chegara. E partiram juntas. Zita e as andorinhas.