Reportagem: Pedro Riveros
No dia 10 de
agosto de 2014 eu estava na cidade de Pedro Juan Caballero. Concluía uma
matéria sobre aliciamento de trabalhadores bolivianos que estão sendo levados
para o Brasil. Trabalhadores que serão os novos escravos do século 21.
Enquanto fazia a matéria encontrei um velho amigo,
Zack Dominguez. Um milionário agricultor paraguaio e proprietário das maiores
plantações de maconha do planeta. Um homem acima de qualquer suspeita. Financiador
de campanhas eleitorais em quase toda a América do Sul.
Zack me
convidou para passar um final de semana em uma de suas mansões em Assunção. Sabia
que ele me ajudaria com informações sobre o que procurava.
No sábado, dia
12 de julho, o pequeno avião veio me buscar. A viagem foi tranquila. Zack me
recebeu com a elegância e a alegria de sempre.
Meu encontro com Roger Abdelmassih
No domingo, dia
13 de julho, enquanto conversávamos na piscina, Zack recebeu uma ligação e me
disse que estava chegando visita, que eu não me importasse. A visita era um casal,
um grande cientista e sua bela esposa.
Minutos
depois um automóvel Mercedes, preto, estacionou na entrada da mansão. A mulher
desceu primeiro. Nunca a havia visto, mas o homem me pareceu familiar. Já o vira
em praticamente todos os veículos de comunicação. Era o ex- médico e fugitivo
Roger Abdelmassih.
Feitas as apresentações,
a mulher mostrou-se profundamente triste, tinha o olhar cansado, entrou na
mansão e de lá não mais saiu. Roger também aparentava cansaço, mas era mais falante.
Extremamente educado, abriu a garrafa de Bourbon e serviu a mim e Zack. Pediu
que eu o chamasse apenas de Roger.
Roger
conversava com Zack e lhe falava sobre a tensão dos últimos dias, das fugas, dos
cuidados com as constantes mudanças de endereços e cidades.
Como jornalista,
não poderia deixar passar aquela grande oportunidade de fazer perguntas à tão
célebre criminoso.
Roger
parecia conhecer seu destino, sabia que os dias de fuga terminariam a qualquer momento.
Só não sabia nem quando, nem onde. Mostrava-se calmo e às vezes sorria preocupado.
Eu senti que
Roger queria falar.
Entrevista com Roger Abdelmassih
P.R - Quem é Roger Abdelmassih?
Roger - Eu sou algo muito próximo de um Deus!
P.R - Por que o senhor acha que é um Deus?
Roger - Eu dei a vida para muitas pessoas!
P.R- Olhando por este lado, todo geneticista é Deus?
Roger- Não,
de forma alguma.
P.R - Então, o que o faz afirmar ser um Deus?
Roger- A
maneira que encontrei de poder ajudar as pessoas. De como pude torná-las
felizes.
P.R - O senhor é uma das pessoas mais procuradas do mundo.
Acusado de dezenas de estupros. Acha mesmo que conseguiu fazer alguém feliz?
Antes de
responder a pergunta, Roger colocou mais um pouco de bebida em sua taça. Bebeu
um pequeno gole, como que procurando no fundo da taça, as palavras adequadas.
Roger - Todas aquelas pessoas que me procuravam, buscavam o que faltava para
completar suas vidas. Todas aquelas pessoas queriam um filho. Muitos queriam um
filho para amar. Outros queriam um filho simplesmente para tentar perpetuar o
nome da família. Tentar perpetuar suas posses. Para a maioria, um filho era a
certeza de felicidade. Para muitas daquelas mulheres, a maternidade, era
cumprir uma missão. Tudo o que fiz foi tentar dar a elas o que sonhavam. O Deus
bíblico não tinha competência para lhes dar, eu tinha!
P.R - Mas o senhor não usou apenas métodos científicos. Usou
métodos naturais de fecundação. Sabia mesmo o que estava fazendo? Estava
consciente do que isso tudo iria acarretar para suas pacientes?
Roger - A ciência é magnífica, mas sabemos que todo o processo de pesquisa é lento.
As pessoas tinham pressa.
P.R - Qual o motivo de violentar suas pacientes?
Roger
franziu a testa, acentuando ainda mais as rugas que mostravam sua idade avançada.
Sua resposta não foi apenas surreal, foi surpreendente.
Roger -
Eu amei cada uma daquelas famílias! Os amei de todo o meu coração. Chegou um
dia que não era mais por dinheiro e poder que eu trabalhava, era por amor.
P.R - O senhor acha mesmo que não violentou nenhuma
daquelas mulheres? Que o que fez foi por amor?
Roger - Sim! Amor puro e incondicional! Eu tive que deixar de lado muito do que
aprendi, tive que deixar de lado décadas de pesquisa, porque eu também comecei
a ter pressa em fazê-las felizes.
P.R - Como foi essa mudança? Como foi que resolveu “acelerar”
o processo?
Roger - Durante os tratamentos descobri que muitas mulheres eram férteis, que o
problema estava nos companheiros, eles eram estéreis. Percebi que não precisava
perder meses, anos, com tratamentos que poderiam ser simples. Que não era
preciso procurar doadores de sêmem. Percebi que não precisava perder tempo com provetas.
Eu seria o doador!
P.R - Suas pacientes perguntavam quem eram os doadores?
Roger - Não. O doador é um segredo guardado para sempre. Tranca-se o cofre e
joga-se a chave fora.
P.R - Como o senhor fazia?
Roger - Eu fazia o procedimento normal. Fazia uma parte do tratamento, esperava
o tempo adequado, para que as pacientes e seus companheiros não desconfiassem. Marcava
o dia da inseminação. Simplesmente as penetrava e ejaculava. Sempre fui um
homem fértil.
P.R - Suas pacientes disseram que o senhor as beijava, qual
o motivo? Não era “ciência”?
Roger- Não
queria que fosse algo mecânico. Precisava ser algo humano. Eu queria que sentissem
um pouco de prazer na hora do “ato”.
P.R - O senhor conseguiu engravidar alguma de suas
pacientes?
Roger
colocou a mão na testa, cobrindo o sol que batia em seu rosto e sorriu satisfeito.
Pela primeira vez mostrou-se alegre.
Roger - Não sei o número exato, chegou uma hora que parei de contar. Chega perto
de uma centena.
P.R - O senhor é pai de quase cem pessoas?
Roger - Aproximadamente.
P.R - Se o senhor engravidou tantas pacientes, porque
somente quarenta lhe acusam de
estupro? Acha que vão aparecer mais acusações?
Roger - Acho que depois que tudo isso veio à tona, muitas pessoas não vão
querer perder a felicidade que lhes proporcionei. Creio que todos ficarão em silêncio.
O silêncio será eterno. Para o bem de todos.
P.R - O senhor leu o livro de Pedro Cavalcanti?
Roger - Li.
P.R- Depois dessa conversa, me diga realmente, quem é
Roger Abdelmassih?
Roger - Deus! Eu sou Deus!
Roger
Abdelmassih foi preso dias depois em Assunção no Paraguai. Cumpre uma pena de duzentos e oitenta anos em um presídio
em São Paulo, Brasil.
Pedro
Riveros é apenas um personagem. Esta é uma entrevista fictícia.